António Guterres é o primeiro português a receber
o prestigiado prémio internacional, atribuído desde 1950 a personalidades
que tenham contribuído para a unidade do continente europeu. Já distinguiu
figuras como Winston Churchill, Robert Schuman, Jacques Delors, Bill Clinton,
Jean-Claude Juncker, Angela Merkel e os Papas Francisco e João Paulo II.
Na cerimónia de entrega do prémio participaram, entre
outros, o primeiro-ministro, António Costa, o presidente da Comissão Europeia,
Jean-Claude Juncker, e o Rei de Espanha, Felipe VI, a quem coube o discurso
laudatório.
"Fico muito orgulhoso enquanto espanhol e amigo
de Portugal, e também como europeu, que António Guterres receba este ano o
Prémio Carlos Magno", declarou Felipe VI.
O Rei de Espanha não poupou elogios ao antigo
primeiro-ministro português e, citando Fernando Pessoa - "Tudo vale a pena
quando a alma não é pequena" -, afirmou que "a alma de António
Guterres é imensa, assim como são a sua sabedoria, experiência e paixão com que
defende os seus ideais".
António Guterres apelou a "uma
Europa forte e unida", em Aachen, na Alemanha, após receber o
prémio internacional Carlos Magno pela sua defesa do modelo europeu de
sociedade, do pluralismo, tolerância e diálogo, Guterres insistiu na
necessidade imperiosa de uma agenda multilateral "nestes tempos de grande
ansiedade e desordem geopolítica".
Referiu que a União Europeia tem uma responsabilidade
acrescida na sua defesa, até por ser "pioneira, mas também um posto
avançado do multilateralismo e o primado do direito", valores cada vez
mais postos em causa nos dias de hoje. "Como secretário-geral das Nações
Unidas, nunca senti tão claramente a necessidade de uma Europa forte e
unida", disse.
Este indicou que o mundo enfrenta atualmente "três desafios sem precedentes" que
agravam os riscos de confrontação e exigem respostas vigorosas: as alterações
climáticas - que classificou como sendo "hoje uma questão de vida ou
morte" -, a demografia e migrações, e a era digital.
"O multilateralismo está sob fogo precisamente
quando dele mais precisamos, e quando nunca foi tão adequado para fazer face a
todos os desafios", defendeu.
Apontando que "a UE constitui uma experiência
única em soberania partilhada", António Guterres comentou que se desenha
atualmente "uma nova ordem mundial, com destino ainda desconhecido",
razão pela qual "o mundo parece hoje caótico", e para essa nova ordem
mundial multilateral é essencial uma Europa forte e unida.
Referiu que as
Nações Unidas precisam de uma Europa forte e unida
"Mas mesmo que acabemos por ter um mundo
multipolar, tal não é por si só uma garantia de segurança e paz comum",
disse, acrescentando que basta recordar a História antes da I Guerra Mundial,
quando, "sem um sistema multilateral na época, uma Europa multipolar não
foi capaz de evitar dois conflitos mortíferos".
"Por tantas razões, e talvez um toque de
saudade, gostaria que a Europa pudesse defender de uma forma mais decisiva a
agenda multilateral. As Nações Unidas precisam de uma Europa forte e
unida", afirmou, advertindo "nunca as instituições do pós-guerra
mundial e os seus valores subjacentes estiveram tão erodidos e colocados à
prova" como hoje.
O secretário-geral da ONU realçou que os conflitos se
tornaram "mais complexos e interligados do que nunca, produzem violações
horrendas da lei humanitária internacional e abusos dos direitos humanos".
As pessoas foram forçadas a fugir de suas casas numa
escala que não se via há décadas
"As pessoas foram forçadas a fugir de suas casas
numa escala que não se via há décadas. E com as portas de um abrigo fechadas.
Os princípios democráticos estão sitiados e o Estado de direito está a ser
enfraquecido. As desigualdades estão a aumentar. O discurso de ódio, o racismo
e a xenofobia estão a incitar o terrorismo através das redes sociais",
alertou.
Defendendo que "tanto as Nações Unidas como a UE
são um legado dos valores do Iluminismo", na sua opinião "o mais
importante contributo europeu para a civilização mundial", António
Guterres afirmou que aquilo a que se assiste hoje na cena mundial, com o
ressurgimento de "paixões nacionalistas, populistas, étnicas e
religiosas", é "a negação do Iluminismo".
"Tendo crescido sob a ditadura de Salazar,
testemunhei o verdadeiro valor da liberdade. Como antigo Alto Comissário da ONU
para os Refugiados, durante 10 anos, vi as cicatrizes da deslocação e
desenraizamento. E a História consolidou a minha forte convicção de que essas
tragédias apenas podem ser evitadas através da prevenção de conflitos e
desenvolvimento através da cooperação internacional", afirmou.
“Não tenho outros poderes senão a persuasão e o apelo
à razão”
Para tal, o mundo precisa mais do que nunca "dos
dois maiores projetos de paz dos nossos tempos, as Nações Unidas e a União
Europeia", sustentou.
"Como secretário-geral das Nações Unidas, não
tenho outros poderes senão a persuasão e o apelo à razão. Posso assegurar-vos
que darei sempre o meu melhor na defesa apaixonada dos valores do pluralismo,
da tolerância, do diálogo e do respeito mútuo para construir um mundo de paz,
justiça e dignidade humana", declarou, em português, no encerramento do
seu discurso.
Citação retirada do Jornal de Notícias.
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